[RESENHA] A INGÊNUA LIBERTINA, DE COLETTE

Sinopse: “Um verdadeiro tratado sobre a liberdade, o desejo feminino, o casamento e a maternidade, A ingênua libertina foi publicado por Colette em 1909, mas sua leitura em nada nos parece datada ou antiquada. A escritora francesa consegue, com sua protagonista e com uma linguagem lírica e ao mesmo tempo sagaz, fazer um retrato vívido da condição feminina no início do século XX, tantas vezes podada pelas mãos de uma sociedade que exige tudo de mulheres, menos a independência. Nesta que é uma das obras mais espirituosas de Colette, conhecemos Minne, uma menina atrevida e irreverente que sonha em se juntar a um bando de criminosos de Paris e se aventurar pelo mundo ao lado de um grande amor. Mais tarde, já adulta e casada com um primo, mas frustrada com os rumos que sua vida tomou, ela se lança em casos extraconjugais em busca de prazer e descobertas, embora suas escapadas não saiam exatamente como o esperado. Mas, um dia, tudo parece mudar… A ingênua libertina é um romance que traz muito da biografia de sua autora, uma personalidade literária peculiar e virtuosa que desafiou as convenções da sua época e que soube ser original e popular, encantando, assim, a França e o mundo.”

 

É praticamente impossível falar sobre A ingênua libertina (1909), de Colette, sem mencionar o seu primo mais velho, o também francês Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert. Nos dois romances, temos mulheres que anseiam encontrar o êxtase: algo que faça com que elas saiam da rígida estrutura reservada às mulheres burguesas de sua época.

Em A ingênua libertina, no entanto, podemos entender esse êxtase como a satisfação sexual. Minne, a protagonista, tem plena consciência sobre o prazer que os homens conseguem alcançar, o desfalecimento do corpo ao atingir o gozo, a plena satisfação sexual. E ela quer sentir-se assim também, plena. Sexualmente falando.

O livro é dividido em duas partes. Na primeira, acompanhamos a Minne “moça casadoura”, uma menina extremamente mimada pela mãe, quase um bibelô de porcelana. Ela fantasia uma vida de aventuras ao ler a seção policial do jornal (escondida da mãe, é claro). Já nesta fase percebemos o quanto a beleza ao mesmo tempo pura e enigmática de Minne encanta perdidamente seu primo, Antoine. É citado, inclusive, (repetidamente) os lindos olhos escuros da moça, o que me lembrou outra personagem inesquecível do Realismo — desta vez, brasileiro — Capitu.

 

Veja também: Ela é feita de mulher, simplesmente: Editora Ímã lança A vagabunda, de Colette.

 

Na segunda parte, Minne já está casada. No entanto, parece ainda mais longe de alcançar o êxtase, mesmo acumulando alguns casos extraconjugais. É muito interessante, mesmo nos dias atuais (ou talvez principalmente), ler sobre uma mulher que quer, simplesmente, ter prazer. Minne foi educada para ser uma bela imagem, mas recusa-se a ser estática, mesmo que isso possa lhe causar alguns problemas. Ainda traçando um paralelo à Emma Bovary, Minne é mimada e egoísta, mas não conseguir vê-la como uma personagem odiosa, como a protagonista de Flaubert eventualmente é (na minha leitura da obra). Preciso ressaltar, no entanto, que não estou dizendo que um livro é melhor que o outro. Madame Bovary foi um marco na literatura mundial. Mostrou que uma sociedade de valores adoecidos pode facilmente adoecer uma pessoa. Emma, em que pese alguma antipatia de minha parte, não pode ser condenada pela ingenuidade de querer e buscar a todo custo um amor como o que ela leu nos livros. A trajetória desta personagem é o que faz o livro ser o que ele é: um clássico que merece ser lido por todos (eu quero, inclusive, ler mais uma vez).

Talvez tenha sido um acerto Colette ter eliminado o fator maternidade de seu romance — um dos motivos que justificam certo rancor por Emma Bovary é, justamente, o desprezo que ela tem pela filha, — ou provavelmente o deleite que tive com essa leitura tenha acontecido justamente pelo romance ter sido escrito por uma mulher.

 

“Enquanto fala, ele a despe. Seus beijos, o contato de seu jovem corpo vigoroso e rosado que cheira a renda de seda, o clarão de beleza misteriosa que a visita nesse momento reanimam uma vez mais, no fundo dos olhos sombrios de Minne, a espera do milagre inesperado… Porém, uma vez mais, ele sucumbe só, e Minne, ao contemplá-lo imóvel tão perto de si, mal ressuscitado de uma bem-aventurada morte, decifra no íntimo de si mesma os motivos de um ódio nascente: detesta ferozmente o êxtase dessa criança fogosa, o desmaio que ele não sabe lhe dar: ‘Esse prazer, ele o rouba de mim! É minha, é minha essa fulminação divina que o derruba em cima de mim! Eu a quero! Ou então, que ele deixe de conhecê-la por mim!…’”

 

“Perfeitamente, ela tem amantes! E é seu direito ter amantes. É o direito de toda mulher enganada pela vida.”

 

A ingênua libertina foi uma leitura excitante, nas várias acepções que essa palavra possa abarcar. Comprei o livro há algum tempo, mas iniciei essa leitura logo após assistir ao filme Colette (2018), com a atriz Keira Knightley no papel da escritora francesa. No dia seguinte, já havia terminado a leitura, buscando saber mais e ler mais de Colette, essa autora talentosa e transgressora até para os dias atuais.

 

 

 

Título: A ingênua libertina

Autora: Colette

Tradução: Rachel Jardim

Editora: Nova Fronteira

Páginas: 160

Compre na Amazon: A ingênua libertina

 

Veja o trailer de Colette abaixo:

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