[RESENHA] A MARCA NA PAREDE, CONTO DE VIRGINIA WOOLF

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Virginia Woolf (1882-1941) é uma escritora bastante conhecida por romances como Mrs. Dalloway, Orlando, Rumo ao Farol, e também por seus ensaios, muitos com temática feminista. Mas uma faceta que, para muitos, ainda pode ser desconhecida, é o talento da autora também na escrita de contos. Quando a rotina fica meio apertada, mas não queremos deixar de ler alguma coisa, uma boa opção é embarcar em histórias curtas, que podem proporcionar leituras tão agradáveis quanto os grandes romances.

O título foi indicação da Francine Ramos, do blog Livro e Café, que está promovendo o Clube de Leitura de Virginia Woolf no facebook. Ainda que não tenha sido possível, para mim, acompanhar o cronograma de leituras, o Clube é uma boa dica para quem deseja conhecer mais sobre Virginia Woolf e suas obras.

A Marca na Parede foi escrito entre 1917 e 1921, período em que o mundo era palco da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Nele, a partir de uma simples marca na parede, embarcamos em uma jornada mental sobre tudo o que aquela marca poderia significar.

 

Foi em meados de janeiro deste ano que olhei pela primeira vez para cima e vi a marca na parede. Para fixar uma data é preciso lembrar o que se viu. Por isso eu penso agora no fogo; no inalterável véu de luz amarela sobre a página do meu livro; nos três crisântemos na jarra de vidro redonda na lareira. Sim, deve ter sido no inverno, e tínhamos acabado de terminar o nosso chá, pois lembro que eu estava fumando quando olhei para cima e vi a marca na parede pela primeira vez.” (p. 11)

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Além da técnica do fluxo de consciência, muito marcante nas obras da autora, também é uma felicidade ler ecos do discurso feminista tão bem elaborado e defendido na produção literária de Woolf.

 

Quão chocante, no entanto quão maravilhoso, descobrir que essas coisas verdadeiras, os almoços de domingo, os passeios de domingo, as casas de campo e as toalhas de mesa, não eram afinal tão verdadeiras assim, sendo de fato meio fantasmais, e que a danação que se abatia sobre quem não acreditava nelas era apenas um impressão de liberdade ilegítima. O que agora toma o lugar dessas coisas, pergunto-me, dessas coisas importantes e sérias? Talvez os homens, caso você seja mulher; o ponto de vista masculino que governa nossas vidas, que fixa o padrão, que estabelece a Ordem de Precedência de Whitaker, a qual desde a guerra se tornou meio fantasma, suponho eu, para muitos homens e mulheres, e que em breve, é lícito esperar, será motivo de riso na lata de lixo para onde vão os fantasmas, os bufês de mogno e as gravuras de Landseer, deuses e demônios, o Inferno e assim por diante, deixando-nos a todos uma impressão intoxicante de liberdade ilegítima – se existe liberdade…” (p. 18)

 

A Marca na Parede é um conto curto, porém muito bem escrito e trabalhado. É uma viagem na mente desta autora maravilhosa! Sim, creio que na mente dela mesmo, pois não há descrição de nomes dos personagens neste conto. Talvez seja um eu lírico, mas prefiro pensar que é a própria Virginia Woolf, em sua prosa poética. A marca na parede? Era uma coisa bastante simples. Tão simples quanto surpreendente.

Você pode encontrar este conto para leitura em coletâneas de contos da autora. As que conheço e recomendo são as edições da Cosac Naify, de contos completos ou selecionados, este último na edição portátil (de bolso), disponível em e-book e livro físico, na Amazon.

 

Resenha em colaboração com o blog Escritoras Inglesas.

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[…] Quero fazer (mais) um parêntese (eu gosto, dá para perceber!) para relacionar “G. H.” a outras duas leituras que fiz e que conversam lindamente com o livro de Clarice: “Dias de abandono”, de Elena Ferrante (que também ama Clarice!) e o conto “A marca na parede”, de Virginia Woolf. No livro de Ferrante, acompanhamos a jornada de uma mulher para se refazer. Ela precisa submergir após um longo e intenso mergulho emocional ao ter sido abandonada sem mais nem menos pelo marido, interrompendo, dessa forma, um relacionamento de anos. Já em Woolf, a personagem irrompe em um fluxo de consciência a partir de uma marca que vê na parede. Falei um pouco mais sobre esse conto aqui neste post. […]

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