[RESENHA] MRS. DALLOWAY, FILME 1997

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Também conhecido no Brasil como Sra. Dalloway (ou, ainda, como A Última Festa), a adaptação cinematográfica do romance homônimo de Virginia Woolf tenta trazer para a tela toda a complexidade da narrativa da autora, que ficou conhecida por usar o fluxo de consciência, especialmente neste romance.

Uma história a princípio bem simples, de uma senhora envolvida nos preparativos de uma festa que dará em sua casa durante a noite. O cenário é Londres e sua alta burguesia, além de uma melancolia altamente palpável.

É impossível falar de Mrs. Dalloway, seja o romance ou a adaptação para o cinema, sem antes mencionar o famoso método narrativo o qual Virginia Woolf ficou também bastante conhecida: o fluxo de consciência.

O fluxo de consciência é um método narrativo da época modernista, em que os padrões clássicos são postos de lado e os autores exploram a interioridade dos personagens em relação ao mundo e a sociedade. Como muitos dizem, o fluxo de consciência é a literatura dentro da mente dos personagens. Em Mrs. Dalloway, a autora nos mostra o confronto entre a realidade interior de cada personagem e a realidade exterior do mundo.

Clarissa Dalloway vai dar uma festa e neste dia lembra-se de seu passado, refletindo sobre suas escolhas, acertos e possíveis erros. Na juventude, ela namora Peter Walsh e tem uma relação bastante próxima com Sally, mas casa-se com Richard Dalloway, muito por este ser uma opção que lhe garantiria maior segurança e conforto. Ela tem uma ótima vida, pertence à alta classe londrina, tem um bom marido, planeja uma festa… mas ao mesmo tempo está em desequilíbrio interiormente. O reencontro com Peter Walsh, anos depois, no dia de sua festa, acentua o seu conflito interno.

Peter também vive seu conflito, pois embora não se preocupe com as aparências, como seu antigo amor, não conseguiu superar os sentimentos do passado, sobretudo o fato de Clarissa ter se casado com Richard. Viveu sua vida sem grandes realizações, foi para a Índia, apaixonou-se por uma mulher mais nova, mas seu amor por Clarissa sempre esteve e sempre estará ali, numa parte significativa de seu coração. Sente-se insatisfeito pela pessoa que ele acha que Clarissa se tornou; fria, distante e preocupada com as opiniões da sociedade em que vive.

Richard Dalloway foi o único personagem que se manteve tal como era em sua juventude: tinha aspirações políticas e seguiu carreira. Construiu sua vida ao lado de Clarissa, com uma rotina amorosa e confortável. Sally, embora ainda com suas opiniões sobre o mundo e as pessoas, tornou-se a esposa de um industrial e mãe de cinco filhos, tendo uma rotina quase tão caseira quanto Mrs. Dalloway.

O filme também mostra as marcas da Primeira Guerra Mundial em um jovem veterano, Septimus Smith, que ficou neurótico com a morte de seu superior Evans, além das experiências que viveu nas trincheiras. Prestes a ser internado em um manicômio, ele suicida-se pulando da janela de sua casa. Sua morte é mencionada na festa de Mrs. Dalloway e deixa a anfitriã ainda mais pensativa sobre os rumos que a vida pode tomar.

O filme consegue fazer o paralelo entre passado e presente, reflexões e acontecimentos reais. Ainda assim, acredito que a leitura possa ser mais esclarecedora, sobretudo pela questão do fluxo de consciência. Para quem, como eu, ainda não leu o romance, não fica tão difícil de entender o roteiro de Eilleen Atkins, desde que o método narrativo da obra original seja lembrado.

Mrs. Dalloway pode ser cada uma de nós. Uma mulher que viveu sua juventude com toda a paixão que conseguia e que, na velhice, torna-se uma pessoa diferente, saudosa de seu passado. Sua preocupação maior é que todos se divirtam e tenham uma noite agradável em sua festa, contudo, em sua juventude, seus amigos acreditavam que ela pudesse ter um futuro bem mais promissor. Vive toda a melancolia de sua idade, mas não posso dizer que a achei uma personagem infeliz. Casou-se bem, como já dito, e vive uma rotina tranquila. Entretanto, uma parte dela questiona-se sobre como teria sido se ela tivesse escolhido outro caminho.

Assistir essa adaptação me fez pensar, assim como Clarissa, sobre o que eu era há 10 ou 15 anos e sobre o que sou hoje. Na juventude queremos ser tudo o que pudermos ser. Na vida adulta as coisas podem não ser como imaginamos. De vez em quando é bom tirar um dia para o saudosismo e Mrs. Dalloway é uma ótima pedida!

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Mrs. Dalloway

De Marleen Gorris, Inglaterra-Holanda, 1997.

Com Vanessa Redgrave (Mrs. Clarissa Dalloway), Natascha McElhone (Clarissa jovem), Michael Kitchen (Peter Walsh), Alan Cox (Peter jovem), Sarah Badel (Lady Rosseter), Lena Headey (Sally jovem), John Standing (Richard Dalloway), Robert Portal (Richard jovem), Oliver Ford Davies (Hugh Whitbread), Hal Cruttenden (Hugh jovem), Rupert Graves (Septimus Warren Smith), Amelia Bullmore (Rezia Warren Smith), Margaret Tyzack (Lady Bruton), Robert Hardy (Sir William Bradshaw), Richenda Carey (Lady Bradshaw).

 

Roteiro Eileen Atkins.

 

Baseado no romance Mrs. Dalloway, de Virginia Wolf.

 

Fotografia Sue Gibson.

 

Música Ilono Sekacz.

 

Produção First Look Pictures, Bayly/Paré, Bergen Film), BBC Films. DVD Casablanca Filmes.

 

 

Referências:

SOUSA, Simone Elizabeth. O fluxo de consciência em Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf. Acesso em http://cratilo.unipam.edu.br/documents/32405/38116/OFluxoDeConscienciaEmMrsDallaway.pdf

 

http://50anosdefilmes.com.br/2010/sra-dalloway-ou-a-ultima-festa-mrs-dalloway/

 

 

Resenha em colaboração com o blog Escritoras Inglesas.

 

Compre o livro na Amazon: Mrs. Dalloway.

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