[RESENHA] PÓS-F: PARA ALÉM DO MASCULINO E DO FEMININO, DE FERNANDA YOUNG

Sinopse: “Em sua primeira obra de não ficção, Fernanda Young se insere no acalorado debate sobre o que significa ser homem e ser mulher hoje. Em textos autobiográficos, ela se revela como uma das tantas personagens femininas às quais deu voz, sempre independentes e a quem a inadequação é um sentimento intrínseco. E esse constante deslocamento faz com que Fernanda seja capaz de observar o feminino e o masculino em todas as suas potencialidades. É daí que surge o Pós-F, pós-feminismo e pós-Fernanda, um relato sincero sobre uma vida livre de estigmas calcada na sobrevivência definitiva do amor, no respeito inquestionável ao outro e na sustentação do próprio desejo. No livro, que é ilustrado com desenhos da autora, Fernanda oferece sua visão de mundo na tentativa de superar polarizações e construir algo maior, em que caibam todos os gêneros.”

 

Veja também: As pessoas dos livros: Fernanda Young e o seu legado

 

Fernanda Young é tida por muitos como uma feminista controversa. Lendo Pós-F: para além do masculino e do feminino (Ed. Leya, 2018) a gente entende bem o porquê. De começo nós percebemos que ela se incomodava profundamente com o termo feminismo, com as várias restrições que, de forma bem geral, este movimento tem, como excluir os homens do debate, por exemplo. Pós-F é também um Pós-Fernanda, uma profecia irônica que infelizmente se concretizou, com o falecimento da autora em agosto deste ano.

Eu, que gosto de ler sobre feminismo mas também busco opiniões não exatamente convergentes com o que se repete sobre esse assunto nas redes antissociais, já digo que adorei este livro. Pós-F é uma conversa sincera com uma mulher livre antes mesmo de capitalizarem essa liberdade, seja lá com qual intuito. É um livro que a gente lê em uma sentada, e logo quer ler de novo, principalmente pelas cartas e trechos de outros livros de Fernanda Young (incluindo Os Normais, em coautoria com Alexandre Machado), que ilustram bem sobre o que ela fala em cada capítulo.

Talvez os capítulos mais “problemáticos” deste livro sejam o 3 e o 5, “Porque você não experimenta seu corpo antes?” e “Tudo agora é assédio”, respectivamente. No 3 ela entra em um assunto delicado, a transsexualidade. Dentre outras coisas, ela sugere que as pessoas experimentem mais a própria sexualidade antes de partir para uma decisão precipitada, como uma cirurgia de mudança de sexo. A autora defende um maior hibridismo entre os gêneros, o fazer o que se tem vontade, sem rótulos ou necessidade de autoafirmação a todo o momento. Já no 5 ela questiona o conceito do assédio levado ao extremo, do tipo “o homem não pode falar oi que já leva pedrada”. Na verdade, ela vai um pouco mais além, ao dizer que “gostosa” não seria assédio, e sim uma tremenda falta de educação: “Acho grosseria, não gosto, não quero, e por isso posso sempre me virar e dizer: vá para puta que o pariu!”, diz.

Em ambos os capítulos, cabe concordar ou discordar, o leitor é quem sabe, obviamente (e sempre!). Fernanda Young nunca teve papas na língua (ou na ponta da caneta) e tudo o que está no livro é bem condizente com o que ela dizia e faz todo o sentido dentro de sua narrativa. No prefácio do livro ela diz: “não sou especialista em nada. Melhor, não sou especialista de coisa pronta. Procuro me aprimorar em mim, entendendo sobre mim — usando, é claro, tudo que observo nos outros”. E é bem isso mesmo. Não espere um livro que explique aqueles termos em inglês que a gente ouve pra caramba mas tem que procurar no Google a tradução ou um beabá do feminismo. Pós-F é um feminismo em essência: uma mulher livre falando para quem quiser ler.

A parte com a qual eu mais me identifiquei foi o capítulo 7, “Acho que me mato a ter que ser dona de casa”. É engraçado, mas também muito realista. Eu sou o tipo de pessoa que ama ser dona de casa, mas jamais desejo ser apenas dona de casa. A melhor lição desse trecho é: “Cada dia que passa, e há muito, sei que o melhor lugar em que posso estar é em mim. Essa é uma lição que aprendi que deixo com muito amor, neste livro, e todas as vezes em que dou entrevistas: tenham autoestima”.

O final tornou-se, nos últimos meses, melancólico para nós: Desejos para um mundo Pós-F. Dentre outras coisas, Fernanda Young desejou “Que a palavra look seja extinta do vocabulário; Que a cafonice também seja extinta; Que a ignorância, o maior problema do século XXI, também seja extinta”. Que assim seja!

 

 

Veja também: Pós-F: para além do masculino e do feminino, de Fernanda Young, é finalista do Prêmio Jabuti de 2019 na categoria crônicas.

 

 

 

Título: Pós-F: para além do masculino e do feminino

Autora: Fernanda Young

Editora: Leya

Páginas: 128

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