[RESENHA] OLHOS D’ÁGUA, DE CONCEIÇÃO EVARISTO

Sinopse: “Em Olhos d’água Conceição Evaristo ajusta o foco de seu interesse na população afro-brasileira abordando, sem meias palavras, a pobreza e a violência urbana que a acometem. Sem sentimentalismos, mas sempre incorporando a tessitura poética à ficção, seus contos apresentam uma significativa galeria de mulheres: Ana Davenga, a mendiga Duzu-Querença, Natalina, Luamanda, Cida, a menina Zaíta. Ou serão todas a mesma mulher, captada e recriada no caleidoscópio da literatura em variados instantâneos da vida? Elas diferem em idade e em conjunturas de experiências, mas compartilham da mesma vida de ferro, equilibrando-se na “frágil vara” que, lemos no conto “O Cooper de Cida”, é a “corda bamba do tempo”. Em Olhos d’água estão presentes mães, muitas mães. E também filhas, avós, amantes, homens e mulheres – todos evocados em seus vínculos e dilemas sociais, sexuais, existenciais, numa pluralidade e vulnerabilidade que constituem a humana condição. Sem quaisquer idealizações, são aqui recriadas com firmeza e talento as duras condições enfrentadas pela comunidade afro-brasileira.”

 

Conceição Evaristo foi uma grata descoberta que fiz neste ano de 2017. Tendo lido apenas (até o momento) o livro Olhos d’água, já me tornei fã da autora. Para escrever essa resenha, reli todos os contos. E não foi nenhum sacrifício, posso garantir.

Olhos d’água, antologia de contos de Conceição Evaristo, publicada pela primeira vez pela Pallas Editora em 2014 e sendo reimpresso várias vezes desde então, é o tipo de livro que incomoda. Faz chorar, ter medo, desperta empatia. Quando terminei a leitura, prometi a mim mesma que, se um dia eu for professora, todos os meus alunos conhecerão esse livro. Caso eu não seja, ele fica mais que recomendado aqui no blog. A autora da voz e vez a uma parcela da população que historicamente é silenciada. E os contos são de uma escrita tão precisa e tão poética que é impossível não se emocionar.

 

“Vi só lágrimas e lágrimas. Entretanto, ela sorria feliz. Mas eram tantas lágrimas, que eu me perguntei se minha mãe tinha olhos ou rios caudalosos sobre a face. E só então compreendi. Minha mãe trazia, serenamente em si, águas correntezas. Por isso, prantos e prantos a enfeitar o seu rosto. A cor dos olhos de minha mãe era cor de olhos d’água. Águas de Mamãe Oxum! Rios calmos, mas profundos e enganosos para quem contempla a vida apenas pela superfície. Sim, águas de Mamãe Oxum.

(…)

Hoje, quando já alcancei a cor dos olhos de minha mãe, tento descobrir a cor dos olhos de minha filha. Faço a brincadeira que os olhos de uma se tornam o espelho para os olhos da outra.” (ps. 18 e 19)

 

“Ela é que não ia ficar ali assentada. Se as pernas não andam, é preciso ter asas para voar.” (p. 32)

 

As mulheres criadas por Conceição Evaristo, e os homens também, embora em menor número, falam de temas sociais e existenciais de uma forma que os personagens poderiam ser qualquer pessoa. Poderia ser eu, ou você. A dureza da vida, a fome, a violência, os abusos e a linha tênue da permissão. A perda precoce da infância. O amor em várias formas, a morte e a condenação sem justiça. Todos esses temas e alguns outros estão presentes em Olhos dágua. Dentre tantas lágrimas, com a leitura desse livro eu também passei a me questionar qual era a cor dos olhos de minha mãe.

Olhos d’água  tem prefácio de Heloisa Toller Gomes e introdução de Jurema Werneck. São quinze contos que, se não conseguirem te fisgar por sua sensibilidade, pelo menos vão mostrar uma faceta realista e pela voz de quem sente na pele o que é ser negro em um país como o Brasil.

 

 

SOBRE A AUTORA: Conceição Evaristo nasceu em uma favela da zona sul de Belo Horizonte. Teve que conciliar os estudos com o trabalho como empregada doméstica, até concluir o curso Normal, em 1971, já aos 25 anos. Mudou-se então para o Rio de Janeiro, onde passou num concurso público para o magistério e estudou Letras na UFRJ.

Na década de 1980, entrou em contato com o grupo Quilombhoje. Estreou na literatura em 1990, com obras publicadas na série Cadernos Negros, publicada pela organização.

É Mestra em Literatura Brasileira pela PUC-Rio, e Doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense.

Suas obras, em especial o romance Ponciá Vicêncio, de 2003, abordam temas como a discriminação racial, de gênero e de classe. A obra foi traduzida para o inglês e publicada nos Estados Unidos em 2007.

 

 

Título: Olhos D’água
Autora: Conceição Evaristo
Editora: Pallas
Páginas: 116

 

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Eduarda Graciano do Nascimento
11 de dezembro de 2017 14:53

Me deparei com esse livro algumas vezes nesse ano, sempre em listas de mulheres brasileiras negras que mereciam ser lidas. Desde então está na minha listinha.
Sua resenha me deu uma aquecidinha e estou ainda mais animada pra ler! É uma das minhas metas ler mais autoras negras nesse ano de 2018!

Beijos!

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