[Resenha] O beijo na parede, de Jeferson Tenório

[Resenha] O beijo na parede, de Jeferson Tenório

Sinopse: “Forçado a deixar a cidade natal na companhia do pai para morar em um território estranho no sul do país, João, de apenas 11 anos, passa a acumular do dia para a noite uma sucessão de abandonos. Envolto subitamente pelo desamparo total, o jovem herói se esforça em desviar das paredes que emergem no novo cotidiano, repleto de personagens esquecidos. Cavando pequenos espaços de sobrevivência, João promove o improvável encontro entre o niilismo e a cor exuberante das coisas – nativa apenas na mente de uma criança. Jeferson Tenório constrói um narrador singular e tocante nessa sua primeira obra, um verdadeiro arquiteto do invisível, capaz de reposicionar a dor, extrair, entre lágrimas e sorrisos, o sopro de vida de personagens que aparentam estar mortos, ou simplesmente derrubar as paredes mais duras da existência com um beijo, deixando uma alternativa real para a esperança em seu lugar.”

 

O beijo na parede é uma comovente história de quem enfrenta grandes dificuldades desde muito cedo em sua vida. Um relato de ficção que nos conta muito da realidade de um sem número de crianças brasileiras, acometidas pela pobreza e pelo rol de tantas outras mazelas que a acompanham.

Apesar disso, João, o protagonista e narrador da própria história, consegue nos transmitir sentimentos de positividade em meio a todo o caos de sua vida, e nos faz vislumbrar uma perspectiva de que, no fim das contas, pelo menos para ele, tudo daria certo. Mesmo nas suas reflexões mais pessimistas, vislumbramos uma racionalidade construtiva, que um dia poderia ajudá-lo a abandonar sua desolada condição e a superar todo o seu sofrimento psicológico e emocional.

Jeferson Tenório constrói a obra a partir do ponto de vista de um menino de 11 anos, e suas escolhas linguísticas e o ritmo da narrativa são convincentes quanto a isso. Não que o autor tenha optado por uma aproximação da escrita com a oralidade, sobretudo nos diálogos, mas é a maneira de contar que confere a verossimilhança.

João é um garoto muito esperto para a sua idade (e muitas vezes isso é dito a ele), capaz de exprimir pensamentos profundos e filosofar sobre a vida e suas tragédias. Leitores mais preocupados em transformar a obra literária em um relato biográfico podem não acreditar muito que exista um João por aí. Mas não é difícil pensar que alguém, um menino, tendo vivido tudo o que viveu o nosso protagonista, não tenha adquirido a acuidade para refletir sobre todas as coisas que João reflete.

Outro aspecto que chama a atenção, é o título do livro. Depois de ter conhecido Jeferson Tenório por O avesso da pele, procurei saber de suas outras obras. E, convenhamos, ele é muito bom com os títulos. Estela sem Deus, que está na minha lista de desejos, me atrai por uma afinidade particular com o título. Mas O beijo na parede realmente me intrigou até conseguir ler o livro e captar os vários sentidos que são transmitidos por essa expressão, que é, ao mesmo tempo, literal e metafórica.

Por fim, alguns registros: o cenário da história transita entre o Rio de Janeiro e, sobretudo, Porto Alegre, trazendo parte da jornada biográfica do autor para dentro da história. O racismo é abordado de forma menos contundente do que em O avesso da pele, fazendo todo o sentido na narrativa, uma vez que João, ainda descobrindo sua identidade, não tinha a exata compreensão dos mecanismos de opressão racial. Além desses temas, o universo dos livros traz para a história uma possibilidade de resgate. Não apenas da condição social precária, mas dos horrores existenciais, das sombras, da solidão, das tragédias e das tristezas.

Título: O beijo na parede

Autor: Jeferson Tenório

Editora: Sulina

Páginas: 134

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