[Resenha] As margens e o ditado, de Elena Ferrante

[Resenha] As margens e o ditado, de Elena Ferrante

Sinopse: Livro de ensaios de uma das autoras mais prestigiosas da atualidade revela detalhes de seu processo criativo e traça paralelos entre importantes vozes femininas da literatura mundial

 

Em 2020, a The Oprah Magazine descreveu a amada e prestigiada romancista italiana Elena Ferrante como “um oráculo entre os autores”. Nos breves ensaios reunidos em As margens e o ditado, a autora fala sobre a própria jornada como leitora e escritora e oferece um raro olhar sobre as origens de seus caminhos li-terários. Escreve a respeito de suas influências, lu¬tas e sua formação intelectual, descreve os perigos do que ela chama de “língua ruim” e sugere maneiras pelas quais a tradição há muito excluiu a voz das mulheres. Par¬tindo de suas brilhantes reflexões a respeito dos trabalhos de Emily Dickinson, Gertrude Stein, Ingeborg Bachmann e outras, Fer¬rante propõe, então, uma fusão do talento feminino.

 

Ao discorrer sobre o tênue equilíbrio entre seu gosto por limites e organização ― por permanecer dentro das margens ― e seu desejo por desordem e clamor, ela in¬dica uma passagem secreta para o processo de criação de suas obras mais conhecidas: a Tetralogia NapolitanaDias de abandonoA filha perdida e A vida mentirosa dos adultos. A autora aborda como criou e quais as mo¬tivações de suas emblemáticas personagens Lenù e Lila, deixando pistas do quanto as duas incorporam o próprio dilema da lite¬ratura para Ferrante.

 

As três palestras ― inicialmente escritas para os cidadãos de Bolonha, por ocasião das Umberto Eco Lectures ― e o ensaio com¬posto para o encerramento da Conferência de Italianistas sobre Dante e outros clássi¬cos dão corpo a um livro ao mesmo tempo sutil e potente, de uma das maiores escritoras da atualidade. Um livro sobre aventuras na literatura, sejam elas dentro ou fora das margens.

 

Lançamento de janeiro deste ano pela Intrínseca, As margens e o ditado, de Elena Ferrante, já era esperado com grandes expectativas pelos leitores brasileiros, visto que o livro de ensaios já vinha sendo publicado em outros países desde 2021. Se você perguntar para qualquer #ferranter, com certeza grande parte vai afirmar ter reservado o livro na pré-venda, tamanha a vontade de ler algo novo da escritora italiana.

Talvez esse seja o problema das grandes expectativas: com a régua muito alta, a gente pode se frustrar.

Calma, não vou dizer que o livro é ruim, de jeito nenhum! Mas ele não é m-a-r-a-v-i-l-h-o-s-o como eu pensei que seria. Não é incrivelmente profundo e revelador como Frantumaglia, por exemplo. É um bom livro de ensaios-da-Elena-Ferrante. E só.

 

“Escrever é apoderar-se de tudo o que já foi escrito e aprender aos poucos a gastar aquela enorme fortuna”. Ensaio Histórias, eu.

 

Meu ensaio favorito é A caneta e a pena, justamente sobre as margens da escrita: começando com as das folhas dos cadernos escolares, seguida das margens do pensamento. Me veio à memória o conceito de desmarginação, tão explorado não só tetralogia (explicitamente), mas escrita de Ferrante em geral.

Em Água-marinha, o ensaio mais interessante, Ferrante nos mostra como usou o lema diga a coisa nos limites do possível em seus romances mais curtos Um amor incômodo, Dias de abandono e A filha perdida e como o entrelaçamento de histórias e o uso da primeira pessoa como estrutura sempre autobiográfica foi o caminho que ela trilhou na escrita de A amiga genial. O próprio genial do título do primeiro volume de sua tetralogia talvez tenha vindo por influência da Autobiografia de Alice Toklas  de Gertrude Stein. Nós sempre saímos de uma leitura de Elena Ferrante com mais sugestões de leitura, isso é (um ótimo) fato!

Além desses dois ensaios, também integram o volume Histórias, eu A costela de Dante. As margens e o ditado é um livro de leitura rápida, para fazer calmamente em uns dois dias. Se você estiver de folga ou de férias e puder ficar por conta, até menos que isso. Apesar das expectativas levemente frustradas, é sempre muito interessante toda oportunidade de ler Ferrante “fora da ficção” (as aspas se devem por um pseudônimo ser, de todo modo, uma forma de ficção). Como Frantumaglia (ou uma extensão desse livro), é uma leitura que agradará principalmente aos leitores da autora italiana, os (carinhosamente nomeados) #ferranters do início da resenha. Li no e-book, liberado na Amazon antes da data da pré-venda; foi a minha primeira leitura (de livro inédito) de 2023. Antes dele, reli A vida mentirosa dos adultos. Posso dizer que comecei o ano literariamente muito bem.

 

 

Título: As margens e o ditado

Autora: Elena Ferrante

Tradução: Marcello Lino

Editora: Intrínseca

Páginas: 128

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